O KX, além de chato, é considerado maluco, por ter saído de seu confortável buraco no interior do altaneiro estado bandeirante para se aventurar numa terra estranha, fria e distante, onde não conhecia ninguém. Passeando pela internet a gente sempre dá de cara com algum dos seres que por lá ficaram (a absoluta maioria) e eu que sou o maluco (ou pelo menos esquisito) não consigo deixar de questionar a sanidade deles, pois aquela vida sim, pode levar à loucura. Imaginar envelhecer andando pelas mesmas ruelas, indo aos mesmos restaurantes e encontrando os mesmos comuns que conhecem as árvores genealógicas uns dos outros, sempre com as mesmas conversas, brincadeiras e preocupações é deveras claustrofóbico, deprimente e assustador.
E aqui vai, para quem não conhece, o resumo da vida de quase todos os meus "pares" naquela sociedade. Os rapazes vão para a faculdade de engenharia ou administração para depois trabalhar numa das 2 fábricas que mantêm a cidade. Os mais acomodados (como eu era) preferem a faculdade de Direito, que nos oferece um "leque de opções" (como os velhos gostam de dizer) em termos de carreira - inclusive não fazer nada por não conseguirmos nos estabelecer como causídicos e nem passar nos famigerados concursos públicos, que nos elevariam a uma condição de sucesso e santidade perante a comunidade. As mocinhas? Algumas acompanham os namorados no Direito. Outras, ainda sem futuro provedor, vão para as famosas faculdades "espera marido" - geralmente Pedagogia, Psicologia, ou mesmo Administração sem futuro. Com alguma sorte, elas encontrarão o noivo antes de se formar. Daí vem a importância dos barzinhos de faculdade e as respeitáveis baladinhas no clube. Mas os corredores da faculdade funcionam muito bem para os totalmente desengonçados e abstêmios.
Depois da faculdade? Segurem-se pois agora sim vem o momento mais depressivo de todos. É quando os "promissores" filhinhos da classe média provinciana são obrigados a assumir sua total mediocridade, fraqueza, impotência e falta de vergonha. Os pragmáticos da Engenharia e Administração conseguem seus empregos - embora ganhando menos do que esperavam. Os do Direito se dividem em 2 grupos: o dos espertos ou bitolados (ambos minoria) que viram advogados de verdade ou passam nos santificados concursos. Depois, vem a grande maioria - a dos LOSERS. Alguns, cujo pai tem dinheiro, ficam tentando os tais concursos por décadas; os pobres viram "sócios proprietários" de imobiliária (onde podem usar seus conhecimentos legais). Ou ainda assumem o mesmo ilustre título em qualquer outro negócio familiar não relacionado ao nobre estudo das leis, como mercearias, estacionamentos, agências de turismo, etc. Há também uns menos dependentes (por serem mais pobres), que viram bancários ou servidores públicos de último escalão - passam em concurso, embora fácil e sem glamour.
O próximo passo? Casar com aquela namoradinha paciente da faculdade, lembra dela? Então, como ela também não vai sair dalí e não tem nada a perder, ela espera, e é premiada com o pedido de casamento do rapaz, agora "empregado e estável". Eles se casam com pompas locais e vão morar naquela casa que o pai de um dos dois alugava mas teve que dar aviso ao inquilino, fazer uma reforminha e pintar. O carrinho popular (mas novinho) eles já têm, assim como tudo que lhes fará dignos do respeito dos lobotomizados à sua volta. A lua de mel vai ser ali pertinho mesmo, em Ubatuba, pois os pais já bancaram a casa e a festa obrigatória. A não ser pelos mais abonadinhos que vão para a Europa que fala português ou para outros lugares desde que num grupo, onde não passem aperto por serem monoglotas. Por fim, vêm os filhinhos, que também são obrigatórios, é claro, e que os avós também ajudam a criar, obviamente.
Depois? Nada. Ficamos nessa, vendo as crianças, as rugas e a barriga crescer. Mas sempre na segurança, no aconchego e conforto do lugarejo, sob as asas protetoras dos pais enquanto vivos e companhia dos colegas de infância. Estrabilidade, ainda que medíocre e pobre em todos os sentidos, e medo - muito medo de se aventurar sozinho ou fora dalí, onde "ninguém te conhece" e nem vai te ajudar a ser acomodado, covarde e preguiçoso. Parece ser este o ideal. Eu? Prefiro ser maluco.